O Dia do Geógrafo é comemorado em 29 de maio e contaremos alguns feitos deles. Para Yves Lacoste “a geografia é um saber estratégico, um poder” [que serve para governantes e os professores usarem para] “saber pensar o espaço, para saber nele se organizar [e] combater” (LACOSTE, 1993, p. 23, 189) e a Geografia passou por quatro fases (MORAES, 2006), descritas a seguir.
I – Pré-História. O egípcio Eratóstenes (c. 276 a.C. – c. 194 a.C.) mediu corretamente a circunferência da Terra sem computador nem GPS! O famoso filósofo grego Pitágoras (582 a.C.) provou que a Terra tem forma esférica. Na Idade Média, o geógrafo e cartógrafo muçulmano Al-Idrisi (1099, Ceuta) viajou de 1138 a 1154, financiado por Roger – rei da Sicília, e criou o Livro de Roger, um atlas com 70 mapas do mundo da época.
II – Sistematização.
O alemão Alexander von Humboldt (1769–1859) viajou pela América Latina, mapeou territórios, analisou ecossistemas e registrou espécies. Para ele, a Geografia era a parte terrestre da Ciência do Cosmos.
O alemão Karl Ritter (1779–1859) estudou a ligação das características físicas da Terra à história e cultura dos povos e, em Berlim, foi o primeiro professor de Geografia em Universidade. E o alemão Alfred Hettner (1859–1941) deu importância ao estudo integrado entre meio físico e atividades humanas numa Geografia regional alemã que analisou as diferenças no espaço e nas paisagens.
III – Geografia Tradicional.
Geopolítica: criação do sueco Rudolf Kjellén (1864–1922) e do alemão Friedrich Ratzel (1844–1904), que analisa a estratégia e política internacional, territórios e poder, que considerou as nações como organismos vivos com os perigosos conceitos de determinismo geográfico (sociedade humana submetida à natureza) e “espaço vital” (Lebensraum) usados pela Alemanha para anexar países e começar a 2ª Guerra Mundial. No Brasil, destacaram-se Golbery C. Silva, Terezinha de Castro e Bertha Becker, por exemplo.
Geografia Regional: O francês Paul Vidal de La Blache (1845–1918) fundou o Possibilismo Geográfico, oposto ao Determinismo Geográfico e deu importância à ação humana na paisagem, criando regiões e “gêneros de vida” diferentes.
O francês Maximilien Sorre (1880–1962) desenvolveu o conceito de “complexo patogênico“, relacionando ambiente, saúde e doenças, influenciando estudos de saúde e geografia médica. Josué de Castro (1908–1973), geógrafo, médico e escritor brasileiro, estudou a fome e a desigualdade social e explicou as relações entre ambiente, renda e desnutrição em Geografia da Fome e em Geopolítica da Fome. Em um mundo faminto e destruído pela 2ª Guerra Mundial, promoveu políticas globais contra a fome quando foi presidente da Food and Agriculture Organization (FAO/ONU).
Geografia Geral: Richard Hartshorne (EUA, 1899–1992) integrou a Geografia Geral com a Geografia Regional em The Nature of Geography, onde criou teorias e métodos aplicados pela geografia quantitativa.
IV – A Nova Geografia surgiu da necessidade dos geógrafos se libertarem da mera descrição de paisagens e a
Geografia Quantitativa foi iniciada por William Garrison (EUA, 1924–2015), pioneiro do uso de computadores pela Geografia na análise espacial e modelagem geográfica, facilitando o planejamento urbano e regional e a localização das empresas no espaço urbano. Aqui em Rio Claro, Antonio Christofoletti (1928–1999), professor na UNESP contribuiu ao analisar processos fluviais e erosivos da Geomorfologia em computadores, descritos nos livros Geografia Física e Geomorfologia. Aziz Ab’Saber (1924–2012) nasceu em São Luiz do Paraitinga–SP e seus estudos sobre domínios morfoclimáticos e questões ambientais são referências na Biogeografia brasileira. David Harvey (Reino Unido, 1935–) ajudou a sistematizar a geografia quantitativa com Explanation in Geography. Ele se tornou um dos principais geógrafos críticos marxistas ao analisar o impacto das desigualdades sociais do capitalismo no espaço urbano em “A Justiça Social e a Cidade” e continua trabalhando como Professor na Universidade de Nova Iorque.
A Geografia da Percepção foi desenvolvida por Yi-Fu Tuan (China, 1930 – EUA, 2022) em Espaço e Lugar e em Topofilia, na relação emocional e simbólica das pessoas com os lugares onde moram, numa abordagem subjetiva e Humanista.
Lívia de Oliveira (Mairinque, 1927 – 2020), professora da UNESP de Rio Claro, foi pioneira na Didática e no Ensino de Geografia e de Cartografia Escolar, nos estudos de Percepção do Meio Ambiente, traduziu as obras de Yi-Fu Tuan e difundiu a geografia humanista no país. Foi líder do GPGHC e fundou a revista Geograficidade.
Geografia Crítica: o francês Pierre George (1909 – 2006) foi precursor da geografia crítica, estudou população, agricultura e indústria e lecionou em diversas universidades no mundo, incluindo o Brasil.
Yves Lacoste (Marrocos, 1929 –). Geógrafo e geopolítico francês, famoso por “A Geografia – isso serve, em primeiro lugar, Para Fazer a Guerra”, fundou a revista de Geopolítica Hérodote e renovou a Geopolítica e a Geografia Crítica na França.
Milton Santos (1926–2001): baiano e negro, um dos maiores intelectuais do país, revolucionou a geografia ao abordar urbanização, globalização e cidadania. Crítico ao capitalismo, com visão humanista do espaço, foi professor em várias universidades no mundo, escreveu mais de 40 livros, como Por Uma Outra Globalização. Conheci-o, junto com a colega Nara dos Santos na USP de São Paulo e, anos depois, o revi em nova palestra aqui na Unesp. Pena que não tive mais aulas com ele! Restou-me ler seus livros, assistir aos vídeos…
Há muitos outros geógrafos brasileiros como Rui Moreira, Antonio Carlos Robert Moraes, Jurandir Ross etc, mas encerro aqui minhas palavras homenageando a todos os geógrafos e geógrafas, aos que estudaram, aos que conviveram e convivem comigo e aos que ainda não conheço, que temos esta linda tarefa de semear o conhecimento do nosso lugar, de seu ambiente e do cuidado com nosso lugar e com nossa gente ao ministrar esta disciplina linda, que é a Geografia. Feliz dia do Geógrafo!
Referências:
LACOSTE, Y. A Geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. Campinas: Papirus, 3a ed., 1994.
MORAES, A. C. R. Geografia: Pequena História Crítica. Annablume: SP, 20ª ed. 2006.
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