O barulho da festa já está fraco e distante, são três horas e quinze da manhã. Poucas pessoas foram deixadas lá, ainda tinha salgados, bolo e champanhe. Eu me pergunto o que eu faço aqui, sentada nesse balanço do parquinho, e nem vi onde eu estava sentada.
Meu pensamento está longe agora. Onde ele está? Será que já chegou no hotel? Eu me sinto ridícula sentada aqui, sozinha, de branco, sapatos, roupas e chapéu, tudo branco, quando quem deveria estar de branco era apenas a noiva.
Eu queria causar esse horror, principalmente nele. Eu queria ver o seu rosto, a sua expressão de espanto quando ele me viu de branco. Eu queria provocar medo nele quando o padre perguntasse: – “Se alguém tem algo para falar nesse momento, fale ou cale-se para sempre.” Eu, de chapéu branco e véu bordado, fiquei em silêncio. Agora percebo o que “para sempre” significa.
Eu deveria ter gritado naquele dia que ele trouxe o convite. Agora, e só agora, é que essa lembrança me vem na memória. Ele não teve coragem de me dar o convite a manhã toda. Ele só me entregou às duas da tarde. Almoçamos juntos no refeitório da empresa, conversamos sobre a noite anterior, ficamos juntos até as três da manhã, nos amamos intensamente. Foi uma despedida? Tudo planejado. Depois daquele dia, nunca mais falei com ele. Rasguei o convite de casamento na cara dele e saí sem dar satisfação a ninguém. Eu não conseguia ver nada na minha frente, apenas em casa, lembrei-me de que nem sequer tinha dado saída no cartão de ponto.
Minha mãe estava no banheiro, eu fiquei no sofá no quarto escuro. Eu não queria ver ninguém. Tudo isso veio e se foi como se fossem marteladas na minha cabeça. Agora eu estava lá, sentada, imaginando onde ele estaria com sua esposa, sua “eu não sei o que”.
Era eu quem deveria estar ao seu lado e não outra. Até então, eu tinha chorado, agora não tenho forças e a lágrima quente nesse dia de inverno toma conta do meu rosto.
A única explicação para tudo isso é entender que quando você realmente ama, tudo é suportado.
Eu não consigo esquecê-lo. Eu não consigo esquecer o seu primeiro dia de trabalho. Nosso chefe chegou apresentando-o como o novo gerente de vendas.
No dia seguinte, ele veio com um sorriso malicioso e a primeira frase de efeito:
— O que uma menina linda como você está fazendo aqui trabalhando de secretária?
É lógico que acabei por perguntar:
— E onde eu deveria estar?
É claro que ele respondeu o que eu queria ouvir.
— Desfilando para alguma marca famosa, fazendo algum comercial ou coisa do tipo. Tem tantas meninas muito mais feias que você que estão até fazendo novelas.
No começo, eu achei exagero, mas isso me acordou. Afinal, quando eu passo na rua, eu percebo que até as mulheres olham para mim. Comecei a me olhar mais no espelho, principalmente nua, coisa que nunca havia feito antes. Comecei a descobrir o amor-próprio. Ele me ensinou a gostar de mim e me fez um bem danado.
Enquanto os outros homens me passavam cantadas sem sentido e “chulas” ele trouxe simplesmente uma frase escrita em um bilhete na minha mesa para eu encontrar pela manhã:
“Sonhe, mas não desista dos seus sonhos”
Eu estava completamente envolvida, perdida e não sabia. Apaixonada pela simplicidade com que ele me disse o que exatamente eu queria ouvir.
Os dois meses que se passaram, se ele tivesse me convidado para sairmos, eu teria aceitado.
Mas ele não fez isso.
Isso me provocou, me explodiu, me pegou por dentro. Ele não estava com pressa. Não como os outros que pareciam querer-me apenas com um propósito: levar-me para a cama.
Um dia, ele beijou a palma da minha mão e eu queria aquela boca na minha boca, no meu corpo, nos meus seios e onde nenhuma boca tinha estado antes.
Então, ele me entregou um folheto sobre um curso de modelo em São Paulo. Ele estava animado e queria me convencer a todo custo a frequentar aquele curso.
— É o que você precisa. Um curso como esse vai mostrar a sua capacidade.
— Mas eu não tenho dinheiro, você viu o valor aqui? Não tenho dinheiro nem para a taxa de inscrição.
— Há uma maneira, ele respondeu, eu empresto e quando você se tornar famosa, me devolve.
Nós marcamos para sexta-feira. Ele me levou para o curso. Quando paramos em frente ao prédio, pensei que estava sonhando. Um frio veio na barriga, não me lembro como entrei e fiz a inscrição. Eu só sei que não senti as pernas, de tanta emoção. Quando voltei para o carro, fiquei feliz por estar realizando o meu sonho. Ele não conseguiu conter as lágrimas quando disse:
— Você merece uma vida melhor.
Eu queria beijá-lo e beijá-lo, um beijo longo e doce, então eu agarrei seu rosto e lhe disse:
Leve-me onde quiser. Eu avisei minha mãe que eu ia dormir fora hoje, com uma amiga.
Seus olhos estavam iluminados, ele me amava como eu o amava, com paixão e, como naquela noite, muitas vieram. É por isso que eu não acredito porque não fui a escolhida.
Eu estou aqui de branco. Esqueço do mundo, sentada nesse balanço congelado.
Quando ele voltar, direi que não importa o que fez comigo. Eu descobri a vida e isso tem um preço. Eu pagarei sem reclamar. Eu quero isso para mim de qualquer maneira, no final eu também estou de branco, eu também casei com ele. Ele disse um sim muito curto com o coração, mas disse. Fiquei em silêncio diante dos homens e do padre, mas não para a vida.
O primeiro ônibus já está apontando na esquina. Vou pegar o próximo, fico um pouco mais aqui, pensando nas coisas boas que ele me fez passar.
Nenhuma razão deve ser procurada para se explicar quando a vida é dada para viver apenas uma paixão. Você vive somente.
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